quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Mafalda faz 50 anos

A menina que questiona tudo continua atual…e sem rugas

Mafalda faz 50 anos
A menina anticonformista criada por Quino em 1964 completa 50 anos sem perder a atualidade, porque muitas das coisas que ela questionava continuam sem solução na Argentina e no mundo, afirma o famoso autor.
"Às vezes fico surpreendido como algumas tiras desenhadas há mais de 40 anos ainda podem ser aplicadas a questões de hoje", declarou o roteirista e desenhista argentino de 81 anos, numa entrevista por email à AFP de Madrid, onde mora parte do ano. No tempo restante, vive em Buenos Aires. Por motivos de saúde não compareceu ao Festival Internacional de Quadrinhos de Angouleme, França, que montou uma exposição em homenagem a Mafalda.
Através do olhar crítico da menina de classe média, Quino apresentou a própria visão anticonformista do mundo. Não gosta de futebol - diz que não entende - e que foi apenas duas vezes a um estádio. Mafalda não gosta de sopa e critica o mundo dos adultos.
Os seus temas favoritos são os problemas económicos e sociais, as desigualdades, a injustiça, a corrupção, a guerra e o meio ambiente. "Sem ir muito longe, no ano passado saiu em Itália um livro sobre a Mafalda. O mais incrível é como muitas histórias pareciam fazer referência direta à campanha de Berlusconi", comenta.
Há exposições previstas na Argentina, Itália, Espanha, Canadá e México sobre a Mafalda e os 60 anos de carreira do seu autor, cujo nome verdadeiro é Joaquín Salvador Lavado Tejón, nascido a 17 de julho de 1932, em Mendoza (oeste da Argentina).
Desde o primeiro álbum, "Mundo Quino", publicado em 1963, é considerado um dos principais humoristas gráficos do país.
Mas foi a pequena menina de cabelo preto e fita vermelha que o levou à fama em 1964. Quino havia esboçado a personagem um ano antes, numa tira de publicidade de uma marca de electrodomésticos que não prosperou. "Adaptei a tira. Como não tinha que elogiar as virtudes de nenhum aspirador, fi-la a reclamar, carrancuda".
Quino fazia desenhos cheios de humor e poesia 11 anos antes de criar Mafalda e continuou nesta área depois de encerrar as aventuras da popular personagem em 1973. Depois veio o exílio em Milão, em 1976, com o golpe militar, o pior momento da sua vida. "A pátria significa juventude, portanto o fato de estar longe tornou o meu humor um pouco menos vivaz, mas talvez algo mais profundo".
Segundo o desenhista, durante a ditadura, "Mafalda não foi censurada". "Acredito que por a arte das tiras ser considerada um género menor, que não representava uma ameaça como voz histórica. Os desenhos não aparentavam ser uma arte altamente intelectual e eram percebidos como entretenimento".
Quino explica que acabou com a série porque "estava cansado de fazer sempre a mesma coisa". "A decisão passou até por áreas conjugais, porque a minha mulher estava chateada de não saber se podíamos ir ao cinema, convidar pessoas para jantar, porque eu ficava até as 10 da noite com as tiras". "Além disso, era muito difícil não repetir. Quando não tinha mais ideias, recorria ao Manolito ou à Susanita, que eram os mais fáceis. Se tivesse continuado, os mais ricos seriam o Miguelito e o Libertad".
"Havia um professor da minha geração, Oski, que nos disse que nunca deveríamos ter um personagem fixo. E que, se tivéssemos, deveríamos pegar na tira e tapar o último quadrinho com a mão. Se o leitor adivinhasse como terminaria, deveríamos parar de o fazer. Pareceu-me um bom momento e não imaginei que 40 anos depois continuaria vigente".
Mafalda é muito famosa em vários países e Quino diz que fica surpreendido com o facto de ser uma das 10 figuras argentinas mais famosas do século XX. "Acredito que a temática é comum a todos os grupos familiares humanos, estejam na China, na Finlândia ou na América Latina".
Alguns comparam a menina argentina de classe média a Charlie Brown, personagem criada pelo americano Charles Schulz. Para Quino, "Mafalda pertence a um país cheio de contrastes sociais, que apesar de tudo queria integrá-la e fazê-la feliz, mas ela nega-se e rejeita todas as ofertas". "Charlie Brown vive num universo infantil próprio, do qual estão rigorosamente excluídos os adultos, com a diferença de que as crianças querem ser adultos. Mafalda vive num contínuo diálogo com o mundo adulto, mas rejeita-o, reivindicando o direito de continuar a ser uma criança".
De acordo com o autor, "Schulz criou personagens antipáticas, simpáticas, boas, máss, invejosas e isto foi uma revolução. Eu inspirei-me nele, mas como não sou americano fiz uma adaptação muito argentina da coisa".
Ao ser questionado sobre como vê a Argentina e o mundo de hoje, Quino mantém a postura." A nossa obrigação é acreditar que o futuro vai ser melhor, mas no fundo sabemos que tudo continuará a ser como até agora".                                                                                                                      AFP Daqui  

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Reflexão: Quando eu for idoso...

“Quando eu for idoso e deixar de ser como era, tem paciência e compreende-me!

Se entornar comida sobre a camisa ou esquecer como atar os sapatos, recorda as horas que passei a ensinar-te a ultrapassar estes problemas.

Se, quando conversar contigo, repetir vezes sem conta as histórias que conheces de cor, não me interrompas.

Quando eras criança, contei-te milhares de vezes o mesmo conto para adormeceres.

E, se me esquecer do que estava a dizer, espera que me lembre.


Se não o conseguir, talvez não fosse importante o que dizia.

Conformar-me-ei se me escutares nesse momento.

Quando estivermos reunidos em família – ou com os teus amigos – e, sem querer, fizer as minhas necessidades, não te envergonhes de mim, pois não consigo controlar-me.

Pensa em quantas vezes, enquanto crescias, te limpei e, com paciência, esperei que o fizesses no lugar certo.

Não ralhes comigo se não quero tomar banho tantas vezes.

Quando eras pequeno também te perseguia e recorria a mil pretextos para velar pelo teu asseio.

Quando me tomares por ignorante acerca das novas tecnologias e inútil na sociedade, peço-te que me concedas o tempo necessário para aprender algo e poupa-me os teus sorrisos de troça.
Lembra-te que fui eu que te ensinei muitas coisas: a comer, a vestir-te, e que a tua formação é fruto de muitos esforços.

Se alguma vez não quiser comer, não insistas; sei quando posso e quando não devo.

Pensa que deixo de ter dentes fortes para morder e também perco o sentido do gosto.

Quando as pernas cansadas me falharem, dá-me a tua mão para que me apoie.

Foi isso que fiz quando começaste a caminhar.

Por fim, se algum dia me ouvires dizer que preferia morrer, não te chateies.

Isso não nega a importância do teu carinho nem o meu amor por ti.


Desejei-te sempre o melhor e desbravei caminhos que podias percorrer.

Considera que os passos que me adianto a dar abrem outras rotas para ti e inauguram novos tempos.

Jamais te sintas triste e impotente.

Assim como te auxiliei quando começaste a viver, acompanha-me até ao fim do meu caminho.

Dá-me o teu coração, compreende-me e apoia-me.

Dá-me AMOR e paciência.

Devolver-te-ei sempre gratidão e SORRISOS”.
Walter Ballesteros

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

"Aspeto de primeiros europeus surpreende cientistas"

Testes genéticos revelaram um caçador-coletor que viveu há 7 mil anos apresentava uma invulgar combinação de pele e cabelos escuros e olhos azuisA descoberta surpreendeu os cientistas que acreditavam que os primeiros habitantes da Europa eram loiros.
Carles Lalueza-Fox, o responsável pela investigação, publicada na revista científica Nature, adianta que esta conclusão pode querer dizer que a pele clara só apareceu muito mais tarde do que se supunha.
Na base desta investigação, estiveram dois esqueletos descobertos numa gruta nas montanhas do noroeste da Espanha, em 2006. O ambiente fresco e escuro permitiu que as ossadas fossem encontradas em bastante bom estado de conservação, o que permitiu aos investigadores retirar para análise ADN de um dente para sequenciar o seu genoma.
A equipa do Instituto de Biologia Evolutiva de Barcelona concluiu que os primeiros europeus estavam geneticamente mais próximos dos suecos e finlandeses.
"Este resultado foi inesperado", admite  Lalueza-Fox. 
Até aqui, a comunidade científica acreditava que os europeus tinham ficado com a pele clara pouco depois de terem saído de África, há 45 mil anos. "Era assumido que era algo que acontecia em resposta a ir de África para altitudes mais elevadas, onde a radiação UV é muito baixa e é preciso sintentizar vitamina D na pele. A pele fica mais clara bastante rapidamente", explica o responsável. "É óbvio que não é o caso", concluiu, acrescentando que "este homem está na Europa há 40 mil anos e ainda tem pele escura."
As análises ao ADN mostram ainda que a dieta destes humanos seria à base de proteína e que teriam uma intolerância à lactose.
Testes genéticos revelaram um caçador-coletor que viveu há 7 mil anos apresentava uma invulgar combinação de pele e cabelos escuros e olhos azuis. A descoberta surpreendeu os cientistas que acreditavam que os primeiros habitantes da Europa eram loiros.
Carles Lalueza-Fox, o responsável pela investigação, publicada na revista científica Nature, adianta que esta conclusão pode querer dizer que a pele clara só apareceu muito mais tarde do que se supunha.
Na base desta investigação estiveram dois esqueletos descobertos numa gruta nas montanhas do noroeste da Espanha, em 2006. O ambiente fresco e escuro permitiu que as ossadas fossem encontradas em bastante bom estado de conservação, o que permitiu aos investigadores retirar para análise ADN de um dente para sequenciar o seu genoma.
A equipa do Instituto de Biologia Evolutiva de Barcelona concluiu que os primeiros europeus estavam geneticamente mais próximos dos suecos e finlandeses.
"Este resultado foi inesperado", admite  Lalueza-Fox. 
Até aqui, a comunidade científica acreditava que os europeus tinham ficado com a pele clara pouco depois de terem saído de África, há 45 mil anos. "Era assumido que era algo que acontecia em resposta a ir de África para altitudes mais elevadas, onde a radiação UV é muito baixa e é preciso sintentizar vitamina D na pele. A pele fica mais clara bastante rapidamente", explica o responsável. "É óbvio que não é o caso", concluiu, acrescentando que "este homem está na Europa há 40 mil anos e ainda tem pele escura."
As análises ao ADN mostram ainda que a dieta destes humanos seria à base de proteína e que teriam uma intolerância à lactose.
in Visão.sapo.pt - Segunda, 27 de Janeiro de 2014 

sábado, 25 de janeiro de 2014

ONG salva dezenas de elefantes na Costa do Marfim

ONG salva dezenas de elefantes na Costa do Marfim (com FOTOS)

Publicado em 25 de Janeiro de 2014.

Dezenas de elefantes foram salvos esta semana em várias aldeias e vilas da Corta do Marfim, de acordo com a International Fund for Animal Welfare, organização não-governamental (ONG) que liderou o processo de salvamento.
A ONG foi chamada ao terreno pelo próprio Governo marfinense, depois de este ouvir vários relatos de animais atacados pelos agricultores. Na verdade, os elefantes estão a perder, paulatinamente, o território onde viveram durante toda a sua vida, devido à desflorestação. Acossados pelas empresas ligadas a esta prática, eles estão a deixar o que sobra da floresta e a chegar aos terrenos agrícolas.
Segundo a imprensa internacional, os responsáveis do International Fund for Animal Welfare (IFAW) entraram nas florestas marfinenses e arriscaram a vida para tranquilizar e transportar os elefantes para lugares seguros. Ao arriscarem a vida estavam, paralelamente, a salvar a dos elefantes.
Os elefantes foram levados para um parque natural a cerca de 330 quilómetros de distância. Apesar de pesarem mais de cinco toneladas, eles foram transportados pela única maneira possível: pela estrada e com escolta do exército da Costa do Marfim.
“Não conseguimos fazer uma captura típica de elefante, como fazemos na savana, por exemplo. Uma árvore típica desta floresta tem 60 metros, por isso é impossível operar um helicóptero aqui”, explicou  Andre Uys, que fez parte da equipa de salvamento.
Segundo a IFAW, os elefantes continuam em perigo na reserva, uma vez que a Costa do Marfim está repleta de caçadores furtivos, que depois vendem o marfim para a China e outros mercados asiáticos. Ainda de acordo com a IFAW, haverá cerca de 100 mil elefantes ameaçados pela rápida desflorestação no centro do continente africano.
Um dos grandes problemas encontrados pela equipa teve como pano de fundo o facto de este ser um animal silencioso. “Os elefantes são silenciosos e podemos encontra-los, literalmente, num qualquer canto. Aí, há muitas hipóteses de ficarmos feridos ou até morrer”, explicou Neil Greenwood, outros dos membros da equipa.
Algumas fotos do salvamento aqui
in http://greensavers.sapo.pt/

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Os idosos, na nossa sociedade

Diz o adágio que “a velhice é um posto”. Com este dizer, pretende-se elogiar um estado de vida em que o declínio físico e mesmo psíquico é compensado com a bagagem de conhecimento e experiência adquiridos. A velhice não é apenas sinónimo de fim de vida, mas pode em muitos casos tornar-se um momento privilegiado na vida.
O velho conselheiro do livro da sabedoria recomenda aos mais novos que saibam honrar os mais velhos e os amparem na sua velhice. E como argumento não se inibe de lembrar que um dia esses que hoje são mais novos serão certamente os mais velhos.
Nos tempos passados, a velhice foi lugar privilegiado e honrado. Aos mais velhos cabiam as decisões e muitas vezes até as decisões em relação ao futuro. Sinal de ponderação e sabedoria, a velhice era de facto um posto. E um posto honrado!
Mas os tempos são agora outros e a sociedade actual criou o mito do homem perfeito, o super-homem, que tem como consequência a supressão de tudo o que é sinal de debilidade. Sociedades perfeitas, que queremos construir a todo o custo, não são compatíveis com doenças ou doentes, nem com pobreza ou pobres. A solução é, então, esconder os sinais de debilidade, chegando mesmo a suprimi-los. Assim, infelizmente, estão a mudar rapidamente os comportamentos dos mais novos em relação aos mais velhos...

De uma atitude de respeito e até veneração, passamos, sem escrúpulos, a uma atitude de confronto e até de violência. Os idosos são agora uma das camadas da sociedade que mais sofre ataques de violência. Os números não enganam e os estudos estão feitos: mais de 25000 casos de violência foram exercidos sobre idosos nos últimos anos.
Violência que tanto toma contornos de agressão física, como também se pratica de uma forma mais psicológica. E é triste vermos como se usa e abusa da bondade que os mais velhos trazem consigo. É triste ver pessoas sem honra aproveitarem-se de quem ainda a tem; é triste, enfim, ver como os mais desavergonhados se aproveitam da honestidade e simplicidade dos mais velhos. Parece haver em tudo isto uma forte contradição, quase ao ponto de fazer pensar que a injustiça e a brutalidade compensam; ao contrário, a verdade e a justiça parece não compensarem.
Face a isto, o que fazer?!
Fica a questão...

in algarvepelavida.blogspot.com

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

O Hinduísmo - Documentário

Brama .......Vixnu ......... Xiva

DOCUMENTÁRIO:
Parte 1 - clica
Parte 2 - clica
Parte 3 - clica
Parte 4 - clica
Parte 5 - clica

in Youtube

Hinduísmo

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

"62% dos islâmicos não quer que as mulheres escolham a roupa"

Um estudo recente da Universidade do Michigan, conduzido em sete países islâmicos, revela que a maioria das pessoas considera apropriado que uma mulher cubra completamente o cabelo em público, mas não necessariamente o rosto.

O inquérito abrangeu cidadãos de sete países, aos quais foi colocada a pergunta "Que estilo de roupa é apropriado para mulheres em público?".

Os entrevistados deveriam escolher uma de seis imagens sem legenda representadas num cartão, entregue pelos entrevistadores. As ilustrações iam da peça de roupa mais conservadora, a burca, que cobre integralmente a cabeça e apenas permite a visão por detrás de uma rede, até à imagem de uma mulher de rosto descoberto e cabelos soltos.
Tunísia (57%), Egito (52%), Turquia (46%) e Iraque (44%) consideram o hijab branco, um véu que cobre o cabelo e as orelhas mas deixa a totalidade do rosto à mostra, a peça de vestuário mais adequada para uma mulher usar em público. No Iraque e no Egito, o hijab negro, mais conservador, foi a segunda escolha mais popular.
No Paquistão, as opiniões dividem-se com 32% a defenderem o hijab negro e 31% a preferirem o niqab, que apenas deixa descobertos os olhos da mulher.

Turquia e Líbano, os mais liberais

Só na Turquia e no Líbano é que mais do que um em cada quatro inquiridos respondeu que as mulheres devem mostrar, em público, a totalidade da cara e o cabelo solto. Com quase metade dos contactados (49%) a defenderem este visual, o Líbano é o país mais liberal na escolha, onde 27 % dos inquiridos praticam a religião cristã. A Turquia é o único país onde ninguém (pelo menos em termos percentuais) escolhe a burca.
Em média, 62% dos entrevistados pensam que uma mulher não pode escolher o que vestir. A Tunísia é o país mais tolerante neste aspeto, onde 56% defendem o direito de escolha da mulher. Seguem-se a Turquia (com 52%), o Líbano (49%) e a Arábia Saudita (47%). O Egito, com 86% de votos contra, é o mais castrador nesta matéria.
O Alcorão, o livro sagrado do islamismo, defende que as mulheres se devem vestir de forma "modesta e decente".
Texto daqui      Imagens daqui

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial da Paz

FRATERNIDADE, FUNDAMENTO E CAMINHO PARA A PAZ
1. Nesta minha primeira Mensagem para o Dia Mundial da Paz, desejo formular a todos, indivíduos e povos, votos duma vida repleta de alegria e esperança. Com efeito, no coração de cada homem e mulher, habita o anseio duma vida plena que contém uma aspiração irreprimível de fraternidade, impelindo à comunhão com os outros, em quem não encontramos inimigos ou concorrentes, mas irmãos que devemos acolher e abraçar.
Na realidade, a fraternidade é uma dimensão essencial do homem, sendo ele um ser relacional. A consciência viva desta dimensão relacional leva-nos a ver e tratar cada pessoa como uma verdadeira irmã e um verdadeiro irmão; sem tal consciência, torna-se impossível a construção duma sociedade justa, duma paz firme e duradoura. E convém desde já lembrar que a fraternidade se começa a aprender habitualmente no seio da família, graças sobretudo às funções responsáveis e complementares de todos os seus membros, mormente do pai e da mãe. A família é a fonte de toda a fraternidade, sendo por isso mesmo também o fundamento e o caminho primário para a paz, já que, por vocação, deveria contagiar o mundo com o seu amor.
O número sempre crescente de ligações e comunicações que envolvem o nosso planeta torna mais palpável a consciência da unidade e partilha dum destino comum entre as nações da terra. Assim, nos dinamismos da história – independentemente da diversidade das etnias, das sociedades e das culturas –, vemos semeada a vocação a formar uma comunidade feita de irmãos que se acolhem mutuamente e cuidam uns dos outros. Contudo, ainda hoje, esta vocação é muitas vezes contrastada e negada nos factos, num mundo caracterizado pela «globalização da indiferença» que lentamente nos faz «habituar» ao sofrimento alheio, fechando-nos em nós mesmos.
Em muitas partes do mundo, parece não conhecer tréguas a grave lesão dos direitos humanos fundamentais, sobretudo dos direitos à vida e à liberdade de religião. Exemplo preocupante disso mesmo é o dramático fenómeno do tráfico de seres humanos, sobre cuja vida e desespero especulam pessoas sem escrúpulos. Às guerras feitas de confrontos armados juntam-se guerras menos visíveis, mas não menos cruéis, que se combatem nos campos económico e financeiro com meios igualmente demolidores de vidas, de famílias, de empresas.
A globalização, como afirmou Bento XVI, torna-nos vizinhos, mas não nos faz irmãos.[1] As inúmeras situações de desigualdade, pobreza e injustiça indicam não só uma profunda carência de fraternidade, mas também a ausência duma cultura de solidariedade. As novas ideologias, caracterizadas por generalizado individualismo, egocentrismo e consumismo materialista, debilitam os laços sociais, alimentando aquela mentalidade do «descartável» que induz ao desprezo e abandono dos mais fracos, daqueles que são considerados «inúteis». Assim, a convivência humana assemelha-se sempre mais a um mero do ut despragmático e egoísta.
Ao mesmo tempo, resulta claramente que as próprias éticas contemporâneas se mostram incapazes de produzir autênticos vínculos de fraternidade, porque uma fraternidade privada da referência a um Pai comum como seu fundamento último não consegue subsistir.[2] Uma verdadeira fraternidade entre os homens supõe e exige uma paternidade transcendente. A partir do reconhecimento desta paternidade, consolida-se a fraternidade entre os homens, ou seja, aquele fazer-se «próximo» para cuidar do outro.
«Onde está o teu irmão?» (Gn 4, 9)
2. Para compreender melhor esta vocação do homem à fraternidade e para reconhecer de forma mais adequada os obstáculos que se interpõem à sua realização e identificar as vias para a superação dos mesmos, é fundamental deixar-se guiar pelo conhecimento do desígnio de Deus, tal como se apresenta de forma egrégia na Sagrada Escritura.
Segundo a narração das origens, todos os homens provêm dos mesmos pais, de Adão e Eva, casal criado por Deus à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1, 26), do qual nascem Caim e Abel. Na história desta família primigénia, lemos a origem da sociedade, a evolução das relações entre as pessoas e os povos.
Abel é pastor, Caim agricultor. A sua identidade profunda e, conjuntamente, a sua vocação é ser irmãos, embora na diversidade da sua actividade e cultura, da sua maneira de se relacionarem com Deus e com a criação. Mas o assassinato de Abel por Caim atesta, tragicamente, a rejeição radical da vocação a ser irmãos. A sua história (cf. Gn 4, 1-16) põe em evidência o difícil dever, a que todos os homens são chamados, de viver juntos, cuidando uns dos outros. Caim, não aceitando a predilecção de Deus por Abel, que Lhe oferecia o melhor do seu rebanho – «o Senhor olhou com agrado para Abel e para a sua oferta, mas não olhou com agrado para Caim nem para a sua oferta» (Gn 4, 4-5) –, mata Abel por inveja. Desta forma, recusa reconhecer-se irmão, relacionar-se positivamente com ele, viver diante de Deus, assumindo as suas responsabilidades de cuidar e proteger o outro. À pergunta com que Deus interpela Caim – «onde está o teu irmão?» –, pedindo-lhe contas da sua acção, responde: «Não sei dele. Sou, porventura, guarda do meu irmão?» (Gn 4, 9). Depois – diz-nos o livro do Génesis –, «Caim afastou-se da presença do Senhor» (4, 16).
É preciso interrogar-se sobre os motivos profundos que induziram Caim a ignorar o vínculo de fraternidade e, simultaneamente, o vínculo de reciprocidade e comunhão que o ligavam ao seu irmão Abel. O próprio Deus denuncia e censura a Caim a sua contiguidade com o mal: «o pecado deitar-se-á à tua porta» (Gn 4, 7). Mas Caim recusa opor-se ao mal, e decide igualmente «lançar-se sobre o irmão» (Gn 4, 8), desprezando o projecto de Deus. Deste modo, frustra a sua vocação original para ser filho de Deus e viver a fraternidade.
A narração de Caim e Abel ensina que a humanidade traz inscrita em si mesma uma vocação à fraternidade, mas também a possibilidade dramática da sua traição. Disso mesmo dá testemunho o egoísmo diário, que está na base de muitas guerras e injustiças: na realidade, muitos homens e mulheres morrem pela mão de irmãos e irmãs que não sabem reconhecer-se como tais, isto é, como seres feitos para a reciprocidade, a comunhão e a doação.
«E vós sois todos irmãos» (Mt 23, 8)
3. Surge espontaneamente a pergunta: poderão um dia os homens e as mulheres deste mundo corresponder plenamente ao anseio de fraternidade, gravado neles por Deus Pai? Conseguirão, meramente com as suas forças, vencer a indiferença, o egoísmo e o ódio, aceitar as legítimas diferenças que caracterizam os irmãos e as irmãs?
Parafraseando as palavras do Senhor Jesus, poderemos sintetizar assim a resposta que Ele nos dá: dado que há um só Pai, que é Deus, vós sois todos irmãos (cf. Mt 23, 8-9). A raiz da fraternidade está contida na paternidade de Deus. Não se trata de uma paternidade genérica, indistinta e historicamente ineficaz, mas do amor pessoal, solícito e extraordinariamente concreto de Deus por cada um dos homens (cf. Mt 6, 25-30). Trata-se, por conseguinte, de uma paternidade eficazmente geradora de fraternidade, porque o amor de Deus, quando é acolhido, torna-se no mais admirável agente de transformação da vida e das relações com o outro, abrindo os seres humanos à solidariedade e à partilha activa.
Em particular, a fraternidade humana foi regenerada em e por Jesus Cristo, com a sua morte e ressurreição. A cruz é o «lugar» definitivo de fundação da fraternidade que os homens, por si sós, não são capazes de gerar. Jesus Cristo, que assumiu a natureza humana para a redimir, amando o Pai até à morte e morte de cruz (cf. Fl 2, 8), por meio da sua ressurreição constitui-nos como humanidade nova, em plena comunhão com a vontade de Deus, com o seu projecto, que inclui a realização plena da vocação à fraternidade.
Jesus retoma o projecto inicial do Pai, reconhecendo-Lhe a primazia sobre todas as coisas. Mas Cristo, com o seu abandono até à morte por amor do Pai, torna-Se princípio novo e definitivo de todos nós, chamados a reconhecer-nos n’Ele como irmãos, porque filhos do mesmo Pai. Ele é a própria Aliança, o espaço pessoal da reconciliação do homem com Deus e dos irmãos entre si. Na morte de Jesus na cruz, ficou superada também a separação entre os povos, entre o povo da Aliança e o povo dos Gentios, privado de esperança porque permanecera até então alheio aos pactos da Promessa. Como se lê na Carta aos Efésios, Jesus Cristo é Aquele que reconcilia em Si todos os homens. Ele é a paz, porque, dos dois povos, fez um só, derrubando o muro de separação que os dividia, ou seja, a inimizade. Criou em Si mesmo um só povo, um só homem novo, uma só humanidade nova (cf. 2,14-16).
Quem aceita a vida de Cristo e vive n’Ele, reconhece Deus como Pai e a Ele Se entrega totalmente, amando-O acima de todas as coisas. O homem reconciliado vê, em Deus, o Pai de todos e, consequentemente, é solicitado a viver uma fraternidade aberta a todos. Em Cristo, o outro é acolhido e amado como filho ou filha de Deus, como irmão ou irmã, e não como um estranho, menos ainda como um antagonista ou até um inimigo. Na família de Deus, onde todos são filhos dum mesmo Pai e, porque enxertados em Cristo, filhos no Filho, não há «vidas descartáveis». Todos gozam de igual e inviolável dignidade; todos são amados por Deus, todos foram resgatados pelo sangue de Cristo, que morreu na cruz e ressuscitou por cada um. Esta é a razão pela qual não se pode ficar indiferente perante a sorte dos irmãos.
A fraternidade, fundamento e caminho para a paz
4. Suposto isto, é fácil compreender que a fraternidade é fundamento e caminho para a paz. As Encíclicas sociais dos meus Predecessores oferecem uma ajuda valiosa neste sentido. Basta ver as definições de paz da Populorum progressio, de Paulo VI, ou da Sollicitudo rei socialis, de João Paulo II. Da primeira, apreendemos que o desenvolvimento integral dos povos é o novo nome da paz[3] e, da segunda, que a paz é opus solidaritatis, fruto da solidariedade.[4]
Paulo VI afirma que tanto as pessoas como as nações se devem encontrar num espírito de fraternidade. E explica: «Nesta compreensão e amizade mútuas, nesta comunhão sagrada, devemos (...) trabalhar juntos para construir o futuro comum da humanidade».[5] Este dever recai primariamente sobre os mais favorecidos. As suas obrigações radicam-se na fraternidade humana e sobrenatural, apresentando-se sob um tríplice aspecto: o dever de solidariedade, que exige que as nações ricas ajudem as menos avançadas; odever de justiça social, que requer a reformulação em termos mais correctos das relações defeituosas entre povos fortes e povos fracos; o dever de caridade universal, que implica a promoção de um mundo mais humano para todos, um mundo onde todos tenham qualquer coisa a dar e a receber, sem que o progresso de uns seja obstáculo ao desenvolvimento dos outros.[6]
Ora, da mesma forma que se considera a paz como opus solidarietatis, é impossível não pensar que o seu fundamento principal seja a fraternidade. A paz, afirma João Paulo II, é um bem indivisível: ou é bem de todos, ou não o é de ninguém. Na realidade, a paz só pode ser conquistada e usufruída como melhor qualidade de vida e como desenvolvimento mais humano e sustentável, se estiver viva, em todos, «a determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum».[7] Isto implica não deixar-se guiar pela «avidez do lucro» e pela «sede do poder». É preciso estar pronto a «“perder-se” em benefício do próximo em vez de o explorar, e a “servi-lo” em vez de o oprimir para proveito próprio (...). O “outro” – pessoa, povo ou nação – [não deve ser visto] como um instrumento qualquer, de que se explora, a baixo preço, a capacidade de trabalhar e a resistência física, para o abandonar quando já não serve; mas sim como um nosso “semelhante”, um “auxílio”».[8]
solidariedade cristã pressupõe que o próximo seja amado não só como «um ser humano com os seus direitos e a sua igualdade fundamental em relação a todos os demais, mas [como] a imagem viva de Deus Pai, resgatada pelo sangue de Jesus Cristo e tornada objecto da acção permanente do Espírito Santo»,[9] como um irmão. «Então a consciência da paternidade comum de Deus, da fraternidade de todos os homens em Cristo, “filhos no Filho”, e da presença e da acção vivificante do Espírito Santo conferirá – lembra João Paulo II – ao nosso olhar sobre o mundo como que um novo critério para o interpretar»,[10] para o transformar.
A fraternidade, premissa para vencer a pobreza
5. Na Caritas in veritate, o meu Predecessor lembrava ao mundo que uma causa importante da pobreza é a falta de fraternidade entre os povos e entre os homens.[11] Em muitas sociedades, sentimos uma profundapobreza relacional, devido à carência de sólidas relações familiares e comunitárias; assistimos, preocupados, ao crescimento de diferentes tipos de carências, marginalização, solidão e de várias formas de dependência patológica. Uma tal pobreza só pode ser superada através da redescoberta e valorização de relaçõesfraternas no seio das famílias e das comunidades, através da partilha das alegrias e tristezas, das dificuldades e sucessos presentes na vida das pessoas.
Além disso, se por um lado se verifica uma redução da pobreza absoluta, por outro não podemos deixar de reconhecer um grave aumento da pobreza relativa, isto é, de desigualdades entre pessoas e grupos que convivem numa região específica ou num determinado contexto histórico-cultural. Neste sentido, servem políticas eficazes que promovam o princípio da fraternidade, garantindo às pessoas – iguais na sua dignidade e nos seus direitos fundamentais – acesso aos «capitais», aos serviços, aos recursos educativos, sanitários e tecnológicos, para que cada uma delas tenha oportunidade de exprimir e realizar o seu projecto de vida e possa desenvolver-se plenamente como pessoa.
Reconhece-se haver necessidade também de políticas que sirvam para atenuar a excessiva desigualdade de rendimento. Não devemos esquecer o ensinamento da Igreja sobre a chamada hipoteca social, segundo a qual, se é lícito – como diz São Tomás de Aquino – e mesmo necessário que «o homem tenha a propriedade dos bens»,[12] quanto ao uso, porém, «não deve considerar as coisas exteriores que legitimamente possui só como próprias, mas também como comuns, no sentido de que possam beneficiar não só a si mas também aos outros».[13]
Por último, há uma forma de promover a fraternidade – e, assim, vencer a pobreza – que deve estar na base de todas as outras. É o desapego vivido por quem escolhe estilos de vida sóbrios e essenciais, por quem, partilhando as suas riquezas, consegue assim experimentar a comunhão fraterna com os outros. Isto é fundamental, para seguir Jesus Cristo e ser verdadeiramente cristão. É o caso não só das pessoas consagradas que professam voto de pobreza, mas também de muitas famílias e tantos cidadãos responsáveis que acreditam firmemente que a relação fraterna com o próximo constitua o bem mais precioso.
A redescoberta da fraternidade na economia
6. As graves crises financeiras e económicas dos nossos dias – que têm a sua origem no progressivo afastamento do homem de Deus e do próximo, com a ambição desmedida de bens materiais, por um lado, e o empobrecimento das relações interpessoais e comunitárias, por outro – impeliram muitas pessoas a buscar o bem-estar, a felicidade e a segurança no consumo e no lucro fora de toda a lógica duma economia saudável. Já, em 1979, o Papa João Paulo II alertava para a existência de «um real e perceptível perigo de que, enquanto progride enormemente o domínio do homem sobre o mundo das coisas, ele perca os fios essenciais deste seu domínio e, de diversas maneiras, submeta a elas a sua humanidade, e ele próprio se torne objecto de multiforme manipulação, se bem que muitas vezes não directamente perceptível; manipulação através de toda a organização da vida comunitária, mediante o sistema de produção e por meio de pressões dos meios de comunicação social».[14]
As sucessivas crises económicas devem levar a repensar adequadamente os modelos de desenvolvimento económico e a mudar os estilos de vida. A crise actual, com pesadas consequências na vida das pessoas, pode ser também uma ocasião propícia para recuperar as virtudes da prudência, temperança, justiça e fortaleza. Elas podem ajudar-nos a superar os momentos difíceis e a redescobrir os laços fraternos que nos unem uns aos outros, com a confiança profunda de que o homem tem necessidade e é capaz de algo mais do que a maximização do próprio lucro individual. As referidas virtudes são necessárias sobretudo para construir e manter uma sociedade à medida da dignidade humana.
A fraternidade extingue a guerra
7. Ao longo do ano que termina, muitos irmãos e irmãs nossos continuaram a viver a experiência dilacerante da guerra, que constitui uma grave e profunda ferida infligida à fraternidade.
Há muitos conflitos que se consumam na indiferença geral. A todos aqueles que vivem em terras onde as armas impõem terror e destruição, asseguro a minha solidariedade pessoal e a de toda a Igreja. Esta última tem por missão levar o amor de Cristo também às vítimas indefesas das guerras esquecidas, através da oração pela paz, do serviço aos feridos, aos famintos, aos refugiados, aos deslocados e a quantos vivem no terror. De igual modo a Igreja levanta a sua voz para fazer chegar aos responsáveis o grito de dor desta humanidade atribulada e fazer cessar, juntamente com as hostilidades, todo o abuso e violação dos direitos fundamentais do homem.[15]
Por este motivo, desejo dirigir um forte apelo a quantos semeiam violência e morte, com as armas: naquele que hoje considerais apenas um inimigo a abater, redescobri o vosso irmão e detende a vossa mão! Renunciai à via das armas e ide ao encontro do outro com o diálogo, o perdão e a reconciliação para reconstruir a justiça, a confiança e esperança ao vosso redor! «Nesta óptica, torna-se claro que, na vida dos povos, os conflitos armados constituem sempre a deliberada negação de qualquer concórdia internacional possível, originando divisões profundas e dilacerantes feridas que necessitam de muitos anos para se curarem. As guerras constituem a rejeição prática de se comprometer para alcançar aquelas grandes metas económicas e sociais que a comunidade internacional estabeleceu».[16]
Mas, enquanto houver em circulação uma quantidade tão grande como a actual de armamentos, poder-se-á sempre encontrar novos pretextos para iniciar as hostilidades. Por isso, faço meu o apelo lançado pelos meus Predecessores a favor da não-proliferação das armas e do desarmamento por parte de todos, a começar pelo desarmamento nuclear e químico.
Não podemos, porém, deixar de constatar que os acordos internacionais e as leis nacionais, embora sendo necessários e altamente desejáveis, por si sós não bastam para preservar a humanidade do risco de conflitos armados. É precisa uma conversão do coração que permita a cada um reconhecer no outro um irmão do qual cuidar e com o qual trabalhar para, juntos, construírem uma vida em plenitude para todos. Este é o espírito que anima muitas das iniciativas da sociedade civil, incluindo as organizações religiosas, a favor da paz. Espero que o compromisso diário de todos continue a dar fruto e que se possa chegar também à efectiva aplicação, no direito internacional, do direito à paz como direito humano fundamental, pressuposto necessário para o exercício de todos os outros direitos.
A corrupção e o crime organizado contrastam a fraternidade
8. O horizonte da fraternidade apela ao crescimento em plenitude de todo o homem e mulher. As justas ambições duma pessoa, sobretudo se jovem, não devem ser frustradas nem lesadas; não se lhe deve roubar a esperança de podê-las realizar. A ambição, porém, não deve ser confundida com prevaricação; pelo contrário, é necessário competir na mútua estima (cf. Rm 12, 10). Mesmo nas disputas, que constituem um aspecto inevitável da vida, é preciso recordar-se sempre de que somos irmãos; por isso, é necessário educar e educar-se para não considerar o próximo como um inimigo nem um adversário a eliminar.
A fraternidade gera paz social, porque cria um equilíbrio entre liberdade e justiça, entre responsabilidade pessoal e solidariedade, entre bem dos indivíduos e bem comum. Uma comunidade política deve, portanto, agir de forma transparente e responsável para favorecer tudo isto. Os cidadãos devem sentir-se representados pelos poderes públicos, no respeito da sua liberdade. Em vez disso, muitas vezes, entre cidadão e instituições, interpõem-se interesses partidários que deformam essa relação, favorecendo a criação dum clima perene de conflito.
Um autêntico espírito de fraternidade vence o egoísmo individual, que contrasta a possibilidade das pessoas viverem em liberdade e harmonia entre si. Tal egoísmo desenvolve-se, socialmente, quer nas muitas formas de corrupção que hoje se difunde de maneira capilar, quer na formação de organizações criminosas – desde os pequenos grupos até àqueles organizados à escala global – que, minando profundamente a legalidade e a justiça, ferem no coração a dignidade da pessoa. Estas organizações ofendem gravemente a Deus, prejudicam os irmãos e lesam a criação, revestindo-se duma gravidade ainda maior se têm conotações religiosas.
Penso no drama dilacerante da droga com a qual se lucra desafiando leis morais e civis, na devastação dos recursos naturais e na poluição em curso, na tragédia da exploração do trabalho; penso nos tráficos ilícitos de dinheiro como também na especulação financeira que, muitas vezes, assume caracteres predadores e nocivos para inteiros sistemas económicos e sociais, lançando na pobreza milhões de homens e mulheres; penso na prostituição que diariamente ceifa vítimas inocentes, sobretudo entre os mais jovens, roubando-lhes o futuro; penso no abomínio do tráfico de seres humanos, nos crimes e abusos contra menores, na escravidão que ainda espalha o seu horror em muitas partes do mundo, na tragédia frequentemente ignorada dos emigrantes sobre quem se especula indignamente na ilegalidade. A este respeito escreveu João XXIII: «Uma convivência baseada unicamente em relações de força nada tem de humano: nela vêem as pessoas coarctada a própria liberdade, quando, pelo contrário, deveriam ser postas em condição tal que se sentissem estimuladas a procurar o próprio desenvolvimento e aperfeiçoamento».[17] Mas o homem pode converter-se, e não se deve jamais desesperar da possibilidade de mudar de vida. Gostaria que isto fosse uma mensagem de confiança para todos, mesmo para aqueles que cometeram crimes hediondos, porque Deus não quer a morte do pecador, mas que se converta e viva (cf. Ez 18, 23).
No contexto alargado da sociabilidade humana, considerando o delito e a pena, penso também nas condições desumanas de muitos estabelecimentos prisionais, onde frequentemente o preso acaba reduzido a um estado sub-humano, violado na sua dignidade de homem e sufocado também em toda a vontade e expressão de resgate. A Igreja faz muito em todas estas áreas, a maior parte das vezes sem rumor. Exorto e encorajo a fazer ainda mais, na esperança de que tais acções desencadeadas por tantos homens e mulheres corajosos possam cada vez mais ser sustentadas, leal e honestamente, também pelos poderes civis.
A fraternidade ajuda a guardar e cultivar a natureza
9. A família humana recebeu, do Criador, um dom em comum: a natureza. A visão cristã da criação apresenta um juízo positivo sobre a licitude das intervenções na natureza para dela tirar benefício, contanto que se actue responsavelmente, isto é, reconhecendo aquela «gramática» que está inscrita nela e utilizando, com sabedoria, os recursos para proveito de todos, respeitando a beleza, a finalidade e a utilidade dos diferentes seres vivos e a sua função no ecossistema. Em suma, a natureza está à nossa disposição, mas somos chamados a administrá-la responsavelmente. Em vez disso, muitas vezes deixamo-nos guiar pela ganância, pela soberba de dominar, possuir, manipular, desfrutar; não guardamos a natureza, não a respeitamos, nem a consideramos como um dom gratuito de que devemos cuidar e colocar ao serviço dos irmãos, incluindo as gerações futuras.
De modo particular o sector produtivo primário, o sector agrícola, tem a vocação vital de cultivar e guardar os recursos naturais para alimentar a humanidade. A propósito, a persistente vergonha da fome no mundo leva-me a partilhar convosco esta pergunta: De que modo usamos os recursos da terra? As sociedades actuais devem reflectir sobre a hierarquia das prioridades no destino da produção. De facto, é um dever impelente que se utilizem de tal modo os recursos da terra, que todos se vejam livres da fome. As iniciativas e as soluções possíveis são muitas, e não se limitam ao aumento da produção. É mais que sabido que a produção actual é suficiente, e todavia há milhões de pessoas que sofrem e morrem de fome, o que constitui um verdadeiro escândalo. Por isso, é necessário encontrar o modo para que todos possam beneficiar dos frutos da terra, não só para evitar que se alargue o fosso entre aqueles que têm mais e os que devem contentar-se com as migalhas, mas também e sobretudo por uma exigência de justiça e equidade e de respeito por cada ser humano. Neste sentido, gostaria de lembrar a todos o necessário destino universal dos bens, que é um dos princípios fulcrais da doutrina social da Igreja. O respeito deste princípio é a condição essencial para permitir um acesso real e equitativo aos bens essenciais e primários de que todo o homem precisa e tem direito.
Conclusão
10. Há necessidade que a fraternidade seja descoberta, amada, experimentada, anunciada e testemunhada; mas só o amor dado por Deus é que nos permite acolher e viver plenamente a fraternidade.
O necessário realismo da política e da economia não pode reduzir-se a um tecnicismo sem ideal, que ignora a dimensão transcendente do homem. Quando falta esta abertura a Deus, toda a actividade humana se torna mais pobre, e as pessoas são reduzidas a objecto passível de exploração. Somente se a política e a economia aceitarem mover-se no amplo espaço assegurado por esta abertura Àquele que ama todo o homem e mulher, é que conseguirão estruturar-se com base num verdadeiro espírito de caridade fraterna e poderão ser instrumento eficaz de desenvolvimento humano integral e de paz.
Nós, cristãos, acreditamos que, na Igreja, somos membros uns dos outros e todos mutuamente necessários, porque a cada um de nós foi dada uma graça, segundo a medida do dom de Cristo, para utilidade comum (cf.Ef 4, 7.25; 1 Cor 12, 7). Cristo veio ao mundo para nos trazer a graça divina, isto é, a possibilidade de participar na sua vida. Isto implica tecer um relacionamento fraterno, caracterizado pela reciprocidade, o perdão, o dom total de si mesmo, segundo a grandeza e a profundidade do amor de Deus, oferecido à humanidade por Aquele que, crucificado e ressuscitado, atrai todos a Si: «Dou-vos um novo mandamento: que vos ameis uns aos outros; que vos ameis uns aos outros assim como Eu vos amei. Por isto é que todos conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros» (Jo 13, 34-35). Esta é a boa nova que requer, de cada um, um passo mais, um exercício perene de empatia, de escuta do sofrimento e da esperança do outro, mesmo do que está mais distante de mim, encaminhando-se pela estrada exigente daquele amor que sabe doar-se e gastar-se gratuitamente pelo bem de cada irmão e irmã.
Cristo abraça todo o ser humano e deseja que ninguém se perca. «Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele» (Jo 3, 17). Fá-lo sem oprimir, sem forçar ninguém a abrir-Lhe as portas do coração e da mente. «O que for maior entre vós seja como o menor, e aquele que mandar, como aquele que serve – diz Jesus Cristo –. Eu estou no meio de vós como aquele que serve» (Lc 22, 26-27). Deste modo, cada actividade deve ser caracterizada por uma atitude de serviço às pessoas, incluindo as mais distantes e desconhecidas. O serviço é a alma da fraternidade que edifica a paz.
Que Maria, a Mãe de Jesus, nos ajude a compreender e a viver todos os dias a fraternidade que jorra do coração do seu Filho, para levar a paz a todo o homem que vive nesta nossa amada terra.
Vaticano, 8 de Dezembro de 2013.
FRANCISCUS

[1]Cf. Carta enc. Caritas in veritate (29 de Junho de 2009), 19: AAS 101 (2009), 654-655.
[2]Cf. Francisco, Carta enc. Lumen fidei (29 de Junho de 2013), 54: AAS 105 (2013), 591-592.
[3]Cf. Paulo VI, Carta enc. Populorum progressio (26 de Março de 1967), 87: AAS 59 (1967), 299.
[4]Cf. João Paulo II, Carta enc. Sollicitudo rei socialis (30 de Dezembro de 1987), 39: AAS 80 (1988), 566-568.
[5]Carta enc. Populorum progressio (26 de Março de 1967), 43: AAS 59 (1967), 278-279.
[6]Cf. ibid., 44: o. c., 279.
[7]Carta enc. Sollicitudo rei socialis (30 de Dezembro de 1987), 38: AAS 80 (1988), 566.
[8] Ibid., 38-39: o. c., 566-567.
[9] Ibid., 40: o. c., 569.
[10] Ibid., 40: o. c., 569.
[11]Cf. Carta enc. Caritas in veritate (29 de Junho de 2009), 19: AAS 101 (2009), 654-655.
[12] Summa theologiae, II-II, q. 66, a. 2.
[13] Conc. Ecum. Vat. II, Const. past. sobre a Igreja no mundo contemporâneo Gaudium et spes, 69; cf. Leão XIII, Carta enc. Rerum novarum (15 de Maio de 1891), 19: ASS 23 (1890-1891), 651; João Paulo II, Carta enc. Sollicitudo rei socialis (30 de Dezembro de 1987), 42: AAS 80 (1988), 573-574; Pont. Conselho «Justiça e Paz», Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 178.
[14] Carta enc. Redemptor hominis (4 de Março de 1979), 16: AAS 61 (1979), 290.
[15]Cf. Pont. Conselho «Justiça e Paz», Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 159.
[16] Francisco, Carta ao Presidente Vladimir Putin (4 de Setembro de 2013): L’Osservatore Romano (ed. portuguesa de 8/IX/2013), 5.
[17] Carta enc. Pacem in terris (11 de Abril de 1963), 17: AAS 55 (1963), 265.

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