Há 58 anos, Naren Chandra Das, um guarda paramilitar indiano, tinha ordens para não falar com o jovem soldado de óculos que escoltava perto de fronteira chinesa, numa missão secreta. Agora, os dois voltaram a encontrar-se numa cerimónia emotiva que lembrou a fuga do líder budista do Tibete, depois de uma insurreição fracassada contra as autoridades chinesas.
A cerimónia teve lugar no domingo, na cidade de Guwahati, no nordeste da Índia. Este encontro poderá causar danos nas relações diplomáticas entre a Índia e a China, uma vez que Pequim considera Dalai Lama um "separatista anti-China". Além disso, o líder budista de 81 anos está a visitar zonas fronteiriças que a China considera seu território, nomeadamente Arunachal Pradesh.
No encontro, foi Dalai Lama quem tomou a palavra, cita o The Guardian. "Olhando para o seu rosto, agora percebo que também devo estar muito velho", disse a Das, de 79 anos.
Quando os dois se abraçaram, Dalai Lama pareceu sussurrar algo a Naren Chandra Das. Quando confrontado com a questão, Das apenas disse "ele estava feliz por me ver". O líder budista também confirmou que estava realmente contente por poder reunir-se com parte da equipa que lhe salvou a vida, segundo a BBC News.
Em Guwahati, Dalai Lama - que nega procurar a independência tibetana - recordou a receção "calorosa" que teve na Índia após treze dias de viagem para escapar ao exército chinês, pelos Himalaias. "Os dias que precederam a minha chegada à Índia eram bastante tensos e a segurança era a única preocupação, mas eu experimentei a liberdade quando fui recebido calorosamente por pessoas e autoridades, e um novo capítulo foi iniciado na minha vida", referiu.
A fuga de Dalai Lama, disfarçado de soldado chinês, deu-se em março de 1959. Saiu durante a noite do seu palácio em Lhasa. Atravessou as montanhas e o rio Brahmaputra, e chegou à fronteira com a Índia. Tinha então 23 anos. Há muito que se verificava um clima de tensão entre os tibetanos e o governo chinês, o que originou uma rebelião popular.
Durante o tempo de fuga, temia-se que o líder espiritual tibetano estivesse entre as 2.000 pessoas mortas pelos chineses. A Índia ofereceu-lhe asilo e uma base na cidade montanhosa de Dharamsala, onde estabeleceu um governo no exílio. Cerca de 80.000 refugiado tibetanos juntaram-se a Dalai Lama.
Por sua vez, a China afirma que a rebelião de 1959 esteve a cargo de proprietários de terras que queriam manter o domínio feudal e que a "libertação pacífica" da região montanhosa trouxe desenvolvimento e prosperidade.
O ministro chinês das Relações Externas reiterou a sua oposição à visita de Dalai Lama às regiões fronteiriças, dizendo que se opõe firmemente "ao apoio e facilitação de qualquer país para as atividades separatistas do 14º grupo anti-China de Dalai Lama".
O facto de a Índia abrigar Dalai Lama foi um dos fatores que conduziu à guerra entre os dois países, em 1962. É também frequente que as tropas chinesas realizem incursões pela fronteira, sendo que as áreas fronteiriças são também altamente militarizadas.
Contudo, os líderes indianos continuam a receber bem Dalai Lama. Narendra Modi, primeiro-ministro, tratou o líder budista como "um convidado de honra" e lançou o convite para um encontro, em dezembro, com o presidente indiano, o que foi condenado pela China. Para Dalai Lama, esta visita foi também "o relembrar da liberdade" que viveu em 1959.
A Índia e o Tibete partilham laços culturais e religiosos e Dalai Lama afirmou a soberania da Índia sobre  Arunachal Pradesh, região localizada no extremo nordeste da Índia e disputada pela China.
O Tibete continua sob controlo chinês e a posse de fotografias ou escritos de Dalai Lama é considerada ilegal.