O Muro de Berlim, com 156 quilómetros de comprimento e três metros de altura a que se juntava no topo a rede de arame farpado, foi a muralha de uma imensa prisão durante 28 anos, 2 meses e 27 dias. Dividia a cidade, o país, a Europa e até o Mundo.
EPA/FLORIAN SCHUH |
A história tem caprichos: o oficial alemão, um coronel, Harald Jager, que às 11 e meia da noite de 9 de novembro de 1989, no meio da enorme confusão daquela longa jornada, se precipitou e mandou abrir a estreita cancela no posto de vigia junto à ponte de Bornholmer, dando assim início a uma eufórica travessia que de imediato alastrou e não mais parou, tinha participado, com convicção, em 13 de agosto de 1961, na grande operação de levantamento do muro de Berlim. Harald Jager esteve assim nos dois momentos limite do “Muro”, a construção e a queda.
No verão de 1961, Harald Jager tinha 18 anos e estava entusiasmado com o modelo de gestão política no setor de Berlim que a partilha da cidade, em 1945, após a guerra, entregara aos soviéticos. Ao longo dos anos 50, ao mesmo tempo que mudaram os nomes das ruas herdadas do tempo nazi, foram sendo instalados pelos pró-soviéticos postos fronteiriços. Chegou a haver 80 controlos ao longo dos 43 quilómetros da linha de separação dentro da cidade Berlim. Puseram cancelas em todas as avenidas, ruas e estradas por onde passava a nova fronteira. À entrada nos anos 60, tornou-se evidente a debandada de gente do setor soviético para o lado ocidental. O êxodo disparou com os rumores de que a fronteira poderia vir a ser fechada. Estão contabilizados 18.000 jovens que se escaparam em junho para o lado ocidental. Foram 20.000 em julho, e quase todos encontravam trabalho através da solidariedade dos aliados ocidentais. A mão de obra começava a faltar no lado soviético de Berlim. Foi então que os dirigentes soviéticos, encabeçados em Berlim por Walter Ulbricht, tomaram a decisão de construção de uma vedação que fosse ao mesmo tempo barreira e intimidatória.
Na manhã de 13 de agosto de 1961, um domingo, milhares de militares, polícias e civis ligados ao partido comunista, foram mobilizados para colocar barreiras de arame farpado ao longo dos 43 quilómetros que separavam o setor soviético de Berlim da parte gerida pelos aliados ocidentais. Nesse domingo, ao perceberem que a fronteira estava a ser fechada, muitos berlinenses que sempre viveram no lado que foi atribuído aos soviéticos, tentaram em desespero mudar-se para o lado ocidental, com tudo o que podiam. Mas já não conseguiram. Os dias seguintes foram de intensas operações. Paralela à linha de arame farpado, a cerca de 100 metros que passaram a ser terra de ninguém, foi desenhada uma outra linha em cima da qual foi rapidamente levantado o alto e longo muro. Multiplicaram-se postos de vigia, servidos por potentes holofotes, em toda a zona da fronteira. Ao mesmo tempo, foram deslocados e realojados todos os moradores nos prédios junto ao muro. Esses prédios, esvaziados, ficaram com as portas e janelas tapadas por tijolos e cimento. Só numa avenida, a Bernauerstrasse, paralela a uma parte do muro, foram deslocadas cerca de duas mil pessoas, numa intervenção dramática em que alguns tentaram dar o salto e acabaram abatidos a tiro. A construção do muro, com 156 quilómetros de extensão, foi acompanhada pela instalação de mecanismos de disparo automático e minas. O controlo tornou-se exaustivo. Permaneceram oito zonas de circulação só acessíveis a ocidentais que iam visitar familiares no leste. Sete dessas travessias eram apenas para peões e uma para comboios, que raramente circulavam e aos quais só podiam aceder, mediante passe especial, residentes no lado ocidental. O então jovem Harald Jager foi um dos civis envolvidos na operação militar que envolveu o levantamento do muro, que foi sempre crescendo em altura e espessura.
Harald Jager foi admitido na Stasi, a sinistra polícia política da RDA, criada em 1950. Subiu na hierarquia. Não chegou a ver, em 26 de junho de 1963, o presidente John F. Kennedy, dos EUA, subir a uma plataforma voltada para o muro e fazer a célebre proclamação “Ich bin ein Berliner” (Eu sou um berlinense). Mas ouviu, em junho de 1987, outro presidente dos EUA, Ronald Reagan, diante da Porta de Brandeburgo, símbolo maior da separação entre os dois mundos da Guerra Fria, desafiar o reformista que tinha tomado o poder em Moscovo: “Senhor Gorbachov, se você realmente deseja a paz e a prosperidade, venha a esta porta e faça abater este Muro.”
Com Gorbachov no Kremlin, todo o antes hermeticamente fechado mundo soviético começou a abrir-se. Na Polónia, o Solidanosc (Solidariedade) do corajoso Lech Walesa ganhava cada vez mais força na exigência de reformas e pluralismo democrático. Na Hungria e na Checoslováquia também crescia a luta pela liberdade. Tal como na RDA.
No sábado, 4 de novembro de 1989, faz agora 30 anos, uma manifestação na Alexanderplatz de Berlim juntou mais de 500 mil pessoas que reclamavam reformas democráticas. Também milhares de pessoas em Leipzig, em Dresden e em outras cidades, sempre com a mesma palavra de ordem: “Wir sind das Volk” (Nós somos o Povo). A maioria desses manifestantes nem chegava a ousar exigir imediatamente o fim do “Muro”. Mas, naqueles dias, o calendário político avançava a velocidade supersónica. Em quase todo o Leste da Europa estava imparável o ímpeto pela libertação democrática. A Berlim, Praga, Budapeste e Varsóvia chegavam cada vez mais jornalistas ocidentais. O governo da RDA introduziu a prática de conferências de imprensa regulares, pelo porta-voz Gunter Schabowski. A pressão popular já tinha levado o governo da RDA a anunciar que estava em estudo facilitar algumas passagens através do Muro. Daqui
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